Lendas dos Judeus #15 (O homem ideal)


ADÃO: O homem ideal
Como todas as criaturas formadas nos seis dias da criação, Adão saiu das mãos de Deus plenamente desenvolvido. Ele não era como uma criança, mas como um homem de vinte anos de idade. As dimensões do seu corpo eram gigantescas, atingindo da terra ao céu ou, o que representa o mesmo, do oriente ao ocidente. Entre as gerações seguintes dos homens, houve poucos cujas medidas compararam-se a Adão em seu tamanho extraordinário e perfeições físicas. Sansão possuía sua força, Saul seu pescoço, Absalão seu cabelo, Asael sua ligeireza de pés, Uzias sua testa, Josias suas narinas, Zedequias seus olhos e Zerubabel sua voz. A história demonstra que essas excelências não representaram bençãos para muitos de seus possuidores; levou à ruína quase todos eles. A força extraordinária de Sansão ocasionou sua morte; Saul suicidou-se cortando o pescoço com sua própria espada; embora corresse com agilidade, Asael foi atravessado pela espada de Abner; Absalão ficou preso pelo cabelo a um carvalho, e assim suspenso encontrou a morte; Uzias foi acometido de lepra na testa; os dardos que mataram Josias entraram-lhe pelas narias, e os olhos de Zedequias foram cegados.
A maioria dos homens herdou tão pouca da beleza quanto do tamanho portentoso de seu primeiro pai. As mais belas mulheres, comparadas a Sara, são como os grandes macacos comparados a seres humanos. O mesmo acontece na comparação de Sara com Eva, mas Eva era também um mero macaco quando comparada a Adão. A figura dele era tão bela que bastava a sola do seu pé para ofuscar o esplendor do sol.
ADÃO ERA TÃO BONITO QUE BASTAVA A SOLA DO SEU PÉ PARA OFUSCAR O ESPLENDOR DO SOL.
Suas qualidades espirituais andavam em paridade com seu charme pessoal, pois Deus formara sua alma com cuidado especial. A alma do homem era a imagem de Deus, e Deus enche o mundo, de modo que a alma enche o corpo humano; da mesma forma que Deus vê todas as coisas, e não é visto por ninguém, a alma vê, mas não pode ser vista; da mesma forma que Deus guia o mundo, a alma guia o corpo; da mesma forma que Deus em sua santidade é puro, também é pura a alma; como Deus habita em segredo, também a alma.
Quando estava para colocar a alma no corpo argiloso de Adão, Deus disse:
– Por onde soprarei a alma dentro do homem? Pela boca? Não, pois ele irá usá-la para falar mal de seu semelhante. Pelos olhos? Com eles ele piscará libidinosamente. Pelos ouvidos? Esses darão atenção a calúnia e blasfêmia. Soprarei a alma em suas narinas: da mesma forma que elas discernem o que é impuro e rejeitam-no, recebendo de bom grado o que é perfumado, os piedosos esquivar-se-ão do pecado, e apegar-se-ão às palavras
da Torá.
As perfeições da alma de Adão manifestaram-se tão logo ele a recebeu, mesmo antes que ele ganhasse vida. No intervalo de uma hora que separou o soprar da alma no primeiro homem e o momento em que ele ganhou vida, Deus revelou-lhe toda a história da humanidade. Deus mostrou a Adão cada geração e seus líderes; cada geração e seus profetas; cada geração e seus professores; cada geração e seus eruditos; cada geração e seus homens de estado; cada geração e seus juízes; cada geração e seus integrantes piedosos; cada geração e seus integrantes comuns, medianos; cada geração e seus integrantes ímpios. A história de seus anos, o número de seus dias, o cálculo de suas horas e a medida de seus passos foram todos revelados a ele.
NO INTERVALO QUE SEPAROU O SOPRAR DA ALMA NO HOMEM E O MOMENTO EM QUE ELE GANHOU VIDA, DEUS REVELOU-LHE TODA A HISTÓRIA DA HUMANIDADE.
De sua própria vontade Adão abriu mão de setenta anos dos que haviam sido designados a ele. Seu tempo designado de vida era para ser de mil anos, um dos dias do Senhor. Mas Adão viu que um único minuto de vida havia sido alocado para a grande alma de Davi, e presenteou-a com setenta dos seus anos, reduzindo os anos que lhe cabiam de mil para novecentos e trinta.
A sabedoria de Adão mostrou-se extremamente vantajosa quando ele deu nome aos animais. Pareceu então que Deus, ao rebater os argumentos dos anjos que se opunham à criação do homem, havia falado bem quando insistira que o homem deveria possuir mais sabedoria do que os anjos.
Adão tinha menos de uma hora de idade quando Deus reuniu todo o mundo animal diante dele e dos anjos. Esses últimos foram chamados para dar nome às diferentes espécies, mas não se mostraram à altura da tarefa. Adão, no entanto, falou sem hesitação:
– Ó Senhor do mundo! O nome apropriado para este animal é touro, este cavalo, este leão, este camelo.
Ele dessa forma chamou a todos, um de cada vez, pelo seu nome, adequando o nome à peculiaridade de cada animal. Deus então perguntou-lhe como ele deveria se chamar, e ele disse “Adão”, porque havia sido criado de Adamah, o pó da terra. Deus então pediu a ele o seu próprio nome, e Adão disse:
– Adonai, “Senhor”, porque és Senhor de todas as criaturas – sendo que Adonai era o nome que Deus havia dado a si mesmo, o nome pelo qual os anjos o chamam, o nome que permanecerá imutável para sempre.
Porém, não fosse o espírito santo, Adão não teria sido capaz de encontrar nome algum; ele era na verdade profeta, e sua sabedoria era uma qualidade profética.
Os nomes dos animais não foram a única herança deixada por Adão para as gerações que seguiram-se a ele, pois a humanidade deve a ele todos os ofícios, especialmente a arte de escrever, e foi ele o inventor de todos os setenta idiomas. Ainda outra tarefa Adão realizou pelos seus descendentes: Deus mostrou a ele toda a terra, e Adão designou quais lugares seriam mais tarde ocupados pelos homens, bem como os lugares que permaneceriam desabitados.




Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas judaicas recolhidas das fontes originais do midrash(particularmente o Talmude) pelo talmudista lituano Louis Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.
Tradução: Paulo Brabo

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