Lendas dos Judeus #07 (O quinto dia)


A CRIAÇÃO: O quinto dia
No quinto dia da criação Deus tomou fogo e água, e desses elementos fez os peixes do mar. Os animais da água são muito mais numerosos do que os da terra. Para cada espécie na terra, com exceção da fuinha, há uma espécie correspondente na água e, além disso, muitas outras encontradas apenas na água.
O regente sobre as criaturas do mar é o leviatã. Juntamente com os outros peixes, ele foi feito no quinto dia. Originalmente ele foi criado macho e fêmea como todos os outros animais. Porém quando ficou evidente que um par desses monstros poderia aniquilar toda a terra com a sua força, Deus matou a fêmea. Tão imenso é o leviatã que para saciar sua sede ele requer toda a água que flue do Jordão mar adentro. Sua comida consiste de peixes que entram espontaneamente entre suas mandíbulas. Quando ele está com fome um hálito quente sopra de suas narinas, que torna as águas do grande mar quentes ao ponto da ebulição. Por mais formidável que seja o behemoth, o outro monstro, ele sente-se inseguro até que o leviatã tenha saciado a sua sede. A única coisa que pode mantê-lo sob controle é o esgana-gato, um pequeno peixe que foi criado com esse propósito, e diante do qual o monstro queda em assombro. Porém o leviatã não é apenas grande e forte; é além disso maravilhosamente formado. Suas barbatanas irradiam ofuscante luz, sendo o próprio sol obscurecido por ela, e também seus olhos projetam tamanho esplendor que o mar é com freqüência repentinamente iluminado por ele. Não é de admirar que essa fera maravilhosa seja o brinquedo de Deus, com o qual ele passa seu tempo.

Apenas uma coisa torna o leviatã repulsivo: seu odioso cheiro, que é tão forte que se penetrasse o próprio Paraíso torna-lo-ia inabitável.
O verdadeiro propósito do leviatã é servir de iguaria aos justos no mundo do porvir. A fêmea foi colocada em salmoura tão logo morta, para ser preservada até o momento em que sua carne será necessária. O macho está destinado a prover uma visão extraordinária a todos os espectadores antes de ser consumido. Quando sua última hora chegar Deus convocará os anjos para que entrem em combate contra o monstro. Mas tão logo o leviatã lance o seu olhar sobre eles os anjos fugirão, desfalecidos de medo, do campo de batalha. Eles retornarão à carga com espadas, porém em vão, porque suas escamas podem repelir o ferro como se fosse palha. Eles não terão mais sucesso quando tentarem matá-lo arremessando pedras e lanças; tais mísseis ricochetearão sem causar a menor impressão no corpo do monstro. Desanimados, os anjos desistirão do combate, e Deus ordenará que o leviatã e o behemoth entrem em duelo um contra o outro. Como resultado ambos cairão mortos, o behemoth esmagado por um golpe das barbatanas do leviatã, o leviatá morto por um açoite da cauda do behemoth. Da pele do leviatã Deus construirá tendas para abrigar as multidões dos piedosos enquanto eles desfrutam dos pratos feitos da sua carne. A quantidade designada a cada justo será proporcional a seus merecimentos, e ninguém invejará ou se ressentirá da porção maior de outro. O que sobrar da pele do leviatã será esticado como toldo sobre Jerusalém, e a luz que se projetará dela iluminará o mundo inteiro, e o que restar da sua carne, depois que os justos tiverem saciado seu apetite, será distribuído entre o restante dos homens.
No mesmo dia em que os peixes foram criados os pássaros, pois essas duas espécies de animais são intimamente relacionadas uma à outra. Os peixes são formados de água, os pássaros de terreno pantanoso saturado de água.
Da mesma forma que o leviatã é o rei dos peixes, o ziz foi apontado para governar sobre os pássaros. Seu nome vem da variedade de sabores que sua carne tem; tem gosto disso, zeh, e daquilo, zeh. O ziz é tão monstruosamente grande quanto o próprio leviatã. Seus tornozelos repousam sobre a terra, e sua cabeça chega ao próprio céu.
Aconteceu certa vez que viajantes num navio perceberam uma ave: ela estava em pé sobre água, que meramente cobria-lhe os pés, e sua cabeça chocava-se contra o céu. Os observadores concluíram que a água não podia ser nada profunda naquele ponto, e prepararam-se para tomar banho ali. Uma voz do céu os advertiu: “Não desçam aqui! Certa vez um machado de carpinteiro escorregou de sua mão neste local, e levou sete anos para chegar ao fundo”. O pássaro que os viajantes viram era nada mais nada menos do que o ziz. Suas asas são tão vastas que abertas obscurecem o sol. Elas protegem a terra contra as tempestades do sul; sem o seu auxílio a terra não seria capaz de resistir aos ventos que sopram daquela direção. Certa vez um ovo de ziz caiu no chão e quebrou. Seu líquido inundou sessenta cidades, e o impacto esmagou trezentos cedros. Felizmente acidentes como esse não ocorrem com freqüência: normalmente o pássaro faz seus ovos deslizarem gentilmente para dentro do ninho. Esse infortúnio ocorreu devido ao fato de que aquele ovo estava podre, e o pássaro jogou-o fora descuidadamente.
O ziz tem outro nomem, Renanin, porque é o cantor celestial. Devido à sua relação com as regiões celestiais ele é também chamado de Seqwi, o vidente, e é além disso chamado de “filho do ninho”, porque ao nascer seus filhotes desembaraçam-se de seus ovos sem o auxílio da mãe; nascem, por assim dizer, diretamente do ninho. Como o leviatã, o ziz é uma das iguarias que será servida aos piedosos no final dos tempos, para compensar as restrições alimentares impostas sobre eles, que proíbem-nos de consumir aves imundas.


Lendas dos Judeus é uma compilação de lendas judaicas recolhidas das fontes originais do midrash(particularmente o Talmude) pelo talmudista lituano Louis Ginzberg (1873-1953). Lendas foi publicado em 6 volumes (sendo dois volumes de notas) entre 1909 e 1928.
Tradução: Paulo Brabo

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