A pergunta de Sofia

Sofia é uma garota de sete anos de idade. Tem cabelos negros como corvos, olhos castanhos e entreabertos como se tentassem impedir a passagem de luz do sol, sua pele é clara, seu rosto é fino e bem delicado. As poucas sardas que contornam seus olhos dão um um toque mais infantil e dá um pouco de contraste com a delicadeza de sua face. Sofia tem um sorriso nada tímido, muito gostoso de se ouvir e extremamente contagiante. As barrocas que se formam em suas bochechas quando ela sorri chegam a tirar a nossa atenção dos espaços dos dentes de leite que caíram semana passada. Sofia é magrinha e bem pequena para uma criança de sua idade. Costuma brincar com coisas leves que não exigem tanto esforço, senão, logo logo ela se cansa. Ela tem uma marca de tamanho de um friso de cabelo no seu antebraço esquerdo. Lembrança de quando encostou sua pele na panela quente que sua mãe tinha acabado de colocar em cima da mesa. Sofia, assim como toda criança, é movida por perguntas. "Por que quando os raios caem na água os peixes não morrem?"; "Se fumar faz mal, por que você fuma?"; "Por que a chuva cai em gotas e não tudo de uma vez?"; "O que é isso?"; "O que é aquilo?"; e por aí vai a lista de perguntas. O interrogatório só aumenta conforme as respostas vão surgindo. 
E é justamente por causa dessas perguntas que estou escrevendo isso. Quero compartilhar uma pergunta em especial que Sofia resolveu soltar antes de dormir enquanto sua mãe a ajudava a orar.
Depois de algum tempo orando, a mãe de Sofia fez a seguinte petição:
- Senhor, muda o jeito de ser do Eduardo. (Eduardo é o irmão mais velho de Duda, mãe de Sofia.) 
- Que ele largue esses costumes que me deixam triste e que, com certeza, te desagradam também, Senhor. Esses lugares que ele frequenta, as coisas que ele lê, a forma que ele fala, aqueles amigos que não me passam confiança, por favor, Senhor, muda o meu irmão para que possamos ser mais próximos um do outro.
Ao terminar a oração, Duda coloca Sofia na cama, ajeita o cobertor, apalpa o travesseiro, beija seu rosto, acaricia seu cabelo e dá boa noite a sua filha. Duda, que estava agachada ao lado da cama,  se levanta apaga a luz do abajur, e caminha até a porta. Quando está quase fechando a porta, Sofia diz: 
- Mamãe!- Sim, querida.- Posso fazer uma pergunta?- Pode sim. Qual é?- Ao invés de pedir pra Ele mudar o tio Eduardo, não poderíamos pedir para Deus te ajudar a amar ele do jeito que ele é?
Duda ficou em silêncio e com os olhos arregalados como se estivesse procurando um lugar para se esconder de alguém que invadiu a casa, perguntou:
- Você acha que dessa forma seria mais fácil?- Não sei. Mas é porque eu não gosto daquele lugar que você vai cheio de gente cortando o cabelo e fazendo barulho. O cheiro de lá é ruim. E sabe aquele livro que a senhora lê? Eu não gosto dele. A capa não tem nenhum desenho e as letras são muito pequenas. E quando a senhora fala de como está chateada com alguma coisa, eu fico triste quando ouço. E aquelas suas amigas que vêem aqui de vez em quando, elas são chatas. Ficam me perguntando um monte de coisas e bagunçam meu cabelo. Elas cheiram a detergente e cebola. Mas eu não quero que Deus te mude por causa disso. Eu não quero outra mãe no seu lugar. Se Deus tirar o cheiro de cebola de suas amigas, pra mim tá tudo bem. Eu posso te amar mesmo sem gostar dessas coisas.




Abraço,
Eliab Alves Pereira

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