Me diz com quem tu andas...

Essa semana estive conversando com uma amiga, acho que posso chamá-la assim, sobre algumas experiências que ela tem passado em sua vida de missionária (no sentido original da palavra). Mirjam é holandesa e está morando no Brasil há um bom tempo. Ela é casada com um amigo meu chamado Fábio (Júnior) - Não é o cantor. Eles faziam parte da junta missionária JOCUM (Jovens Com Uma Missão). Agora que estão morando em Natal, ao invés de serem do JOCUM, estão sendo JOCUM (como o Júnior costuma dizer).

Mirjam trabalha como voluntária no Hospital Infantil Varela Santiago com as mães de crianças internadas na oncologia (crianças com câncer). Ela também tem um trabalho de ajuda a Garotas de Programa em Ponta Negra. Ela e o Júnior ajudam um casal a distribuir sopa a moradores de rua no centro de Natal. E também têm um projeto de uma escola de inglês para crianças na Vila de Ponta Negra. O Júnior faz parte do GruSoC JovenSapiens e dá a maior força a todos nós em nossa missão. A Mirjam já marcou presença em uma de nossas ações e sempre está ajudando como pode. Se você quiser conhecer mais sobre o Júnior e a Mirjam, você pode visitar o site deles que explica direitinho seus projetos, sonhos, experiências, etc., você pode até entrar em contato com eles, se quiser. (Esse é o link http://familiasamen.net/pt/index_pt.html).

Como já falei no início, estive conversando com a Mirjam esses dias e é sobre isso que quero escrever. Depois de escrever eu acredito que não preciso comentar mais nada. É algo simples, objetivo e muito, mas muito reflexivo. Vamos lá!

Eu: Mirjam, me fala sobre o teu trabalho com as Garotas de Programa lá em Ponta Negra. 

Mirjam: Eu tento fazer algo baseado no relacionamento que eu consegui estabelecer com elas. Você sabe que nenhum trabalho desse tipo tem bons resultados se não for construído com relacionamentos. Elas confiam muito em mim e me contam muitas coisas. Há momentos que algumas experiências  são muito fortes e isso me ensina bastante. Uma vez o Júnior foi comigo mas elas não se sentiram muito confortáveis com ele por lá. Pelo fato de ele ser homem gera um desconforto pra elas e elas acabam se retraindo e tendo receio de conversar sobre a vida delas com ele por perto.

Eu: Eu li um livro de Philip Yancey recentemente (Pra que serve Deus?) e ele conta 10 situações da vida dele em que essa pergunta caiu com uma luva. Uma dessas situações foi quando ele foi convidado para palestrar em um congresso voltado a mulheres que caíram na prostituição. Há uma instituição nos EUA chamada RAABE (nome de uma prostituta na bíblia) que tem como objetivo acolher prostitutas que aceitam ajuda. O RAABE oferece cursos, empregos, abrigo, conforto, enfim, oportunidades e amor. Yancey se reuniu com algumas dessas mulheres antes do dia do evento para que pudesse conhecê-las melhor e saber em que terreno estava andando. Ele ressalta a confiança que elas tiveram nele ao contarem coisas bem intrigantes durante o papo. Coisa que o deixou surpreso. Como experiência depois desse evento, ele fala bem sobre a importância de estar junto do outro, de conversar, conhecer, analisar, contar sobre você também, ser amigo. Ele comenta sobre como é fácil mudar de ponto de vista sobre essas mulheres quando você tenta conhecê-las. Sem falar que é uma ótima oportunidade de conhecer a Deus. Uma frase que marca bem o livro é: "Deus está em todo lugar, cabe a nós torná-lo visível".

Mirjam: Eu também li um livro dele que se chama "Descobrindo Deus nos lugares mais inesperados", e ele fala muito sobre enxergar Deus em situações desse tipo. Ele consegue ser muito sensível a isso e eu aprendi a enxergar Deus nas mulheres com quem trabalho. Se relacionar com quem você quer ajudar é a melhor maneira de você ajudar o outro. Eu não posso chegar em frente ao motel onde as mulheres vão toda a noite e dizer que elas estão erradas e vão todas pro inferno. Isso não ajuda. Se elas estão erradas ou não, não cabe a nós julgar. O que precisamos, e elas também, é de aproximação, temos de entender o outro, conhecê-lo.

Eu: No primeiro encontro do JovenSapiens nós falamos sobre relacionamento. Em algum momento nós usamos como exemplo uma mãe que sempre defende o filho independente do que ele tenha feito. Nós observamos que ela faz isso não porque não enxerga a situação, mas porque ela ressalta o que ele tem de bom mesmo quando ele está errado. Ao contrário de nós, ela tenta não deixar que o erro apague o que ela conhece de bom no filho. Pra nós, desconhecedores do amor materno, qualquer erro é suficiente para esquecermos tudo de bom que existe no outro. E é aqui que entra o essencial: conhecer o outro. A mãe só pode ressaltar as coisas boas do filho porque ela conhece essas coisas. Nós não conhecemos o outro e quando vimos algo de ruim nele, vamos logo julgando. Se nós nos déssemos ao luxo de se aproximar, a situação seria bem diferente.

Mirjam: Pois é! Uma das mulheres com quem faço esse trabalho tem quatro filhos. Ou seja, ela não faz isso porque gosta. Ela faz porque tem de sustentá-los. Aí nós pensamos: "Tá, mas ela pode estudar e conseguir capacitação para um emprego". Mas olhamos por outro lado e vemos que se ela for estudar, até ela conseguir capacitação para trabalhar, a família fica sem sustento.

Eu: É uma situação complicada. Uma sinuca. Imagina como ela fica quando, além disso tudo, as pessoas a excluem por isso?!

Mirjam: É verdade! O que os outros pensam e fazem é algo que machuca muito. Eu já passei por experiências que me ajudaram a entender um pouco de como elas se sentem em relação a isso. No início eu me sentia envergonhada ao ir encontrá-las para conversar. Algumas pessoas passavam e ficavam olhando. E eu pensava: "Eles estão pensando que eu também sou prostituta". Isso me deixava com muita vergonha. Daí eu comecei a pensar da seguinte forma: "Bem, e o que aconteceu com Cristo? Quando ele andava com pecadores, sentava com prostitutas, comia na casa de cobradores de impostos; o pessoal pensava a mesma coisa sobre ele. Eles o julgavam ser igual aos excluídos. Mas ele fazia isso pelo bem dos necessitados. Ele não se importava com sua reputação, ele se importava com o próximo." Isso me ajudou a ver os olhares de quem está de fora de outra maneira. Não importa o que vão pensar de mim, o que importa é o que eu estou fazendo por quem precisa.

Eu: Aqui no Brasil nós temos um ditado que diz: "Me diz com que tu andas que eu direi quem tu és." Cristo e você provaram que isso não é verdade.

Mirjam: Pois é! Quem fala isso é quem prefere estar de longe falando ao invés de fazer.


PS: Obrigado, Mirjam!



Abraço,
Eliab Alves Pereira

2 comentários:

  1. Comecei a ler esse post e a cada linha que eu lia, ele me chamava mais a atenção. É exatamente isso que ocorre, as pessoas costumam ver apenas os erros, e não enxergam as coisas boas e sai julgando. Eu mesmo passei por uma situação parecida com a da Mirjam. Eu tenho um amigo que começou a consumir drogas tempos atrás, ele nunca me disse o por que de ter escolhido isso, nem me disse quem o ofereceu essas coisas. Nós éramos muito próximos, ele tinha muitos amigos 'próximos' também, com o tempo, quando eles descobriram isso, foram se afastando, um a um, e chegou um tempo, que de toda aquela roda de amigos, só eu e um primo dele, estava com ele, dando apoio, o ouvindo e querendo muito que ele deixasse o vício. As pessoas olhavam para mim com uma cara de 'por que você ainda está relacionando-se com ele?' e me perguntavam "Você ainda anda com fulano?" e eu falava "Sim, qual é o problema?" e as pessoas se calavam, mas eu sabia o que elas queriam dizer com aquilo. Mas mesmo assim, eu continuei, do lado dele, assim como era antes disso tudo acontecer. Um dia ele chegou pra mim e falou que queria se suicidar por não conseguir deixar o vício e que lembrou da família dele e dos únicos amigos que ainda estavam com ele, que era eu e o primo. Esse dia eu me fiz de forte, dei conselho a ele e o pedi para não consumir naquele dia, e ele me prometeu que não ia consumir. Quando eu cheguei em casa, chorei, chorei muito pois eu não queria que toda aquela situação levasse meu amigo embora e chorava também pelo que ele disse, que eu fui um dos motivos dele não ter levado isso ao extremo. No outro dia eu acordei e tinha uma SMS dele me pedindo pra logar o messenger, daí eu loguei e ele falou que ia se tratar, que sabia que ia ser difícil mas que ele ia conseguir e foi. Hoje ele está curado, não é mais viciado, e tem uma vida. Uma vida que talvez se eu ou o primo dele não tivesse o apoiado no momento que ele mais precisou sem julgá-lo, não existiria, talvez. Hoje ele não mora mais perto de mim, não nos falamos mais como antigamente, mas fico feliz, de ter feito diferença na vida dele. De ter estado ao lado dele, sem me importar com o que os outros iriam pensar.

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  2. Poxa, velho, que experiência, heim? Obrigado, muito obrigado mesmo por compartilhar isso, cara. Ajuda bastante na construção do nosso eu. E você está de parabéns pela tua atitude para com teu amigo. Abração!

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