O barco e o cais

Ó, pobre barco velejante, há dor pior do que ser preso ao cais depois de provar da liberdade do mar? Onde estão teus remos? Pra onde foram seus navegadores? Miseráveis, preferem a segurança do porto! Abandonaram-te. Prenderam-te às margens do teu lar. Monstros! Quem merece tal castigo? Teu corpo ainda pode ser acariciado pela águas mornas. Consegues enxergá-las como um adolescente que olha para sua amada sendo arrancada de seus braços, e quando tenta segurá-la, alguém puxa-lhe pela mão. Prendem-no ao cais. Ela está tão perto, mas alguém não permite que ele a toque. Antes de ser puxado, a última coisa que sentiu foi o delicado toque de seu amor. Assim com tu sentes as carícias suaves do teu amante beijando tua proa. 

Sou navegante. Navego para dentro de mim, onde não há espaço para terra seca. Lembro-me de acenar para todos que ficaram me olhando enquanto me afastava. Eles não quiseram viajar comigo. Temiam o mar. Temiam amar. Preferem o cais. Desejam o que consegue prender os navios. O carrasco dos velejantes! Escolhem a terra pois conseguem dominá-la. No mar, só conseguimos dominar nosso barco. 

Sou navegante sem cais. Sou levado pelo meu barco para onde os ventos decidirem. Não sou dono de onde estou, e a cada onda vencida, encontro mais caminhos para seguir. 

Meu barco está livre. Dentro de mim há muitos mares ansiosos para tocá-lo. Estou numa viagem sem volta. Escolhi velejar, remar, mergulhar. Velejo para longe da terra, não quero segurança. Remo para vencer as ondas, não quero que elas me levem de volta ao porto. Mergulho em busca de ar, aqui dentro respiro melhor. 

Ó, pobre cais, há dor pior do que estar preso à sua segurança enquanto vês o barco velejante beber da liberdade do mar? És como a criança que não pode brincar porque teme a liberdade de estar longe do colo da mãe. Lembro-me de como é tua visão. Já estive onde estais. Já vi os mares convidarem os barcos para dançar. Sei que tua dor é como a dor da gaiola que vê seus pássaros fugirem de si, e não pode fazer nada porque não foi feita para ser livre, mas para aprisionar os que preferem a segurança das grades mesmo com as portas abertas.


Eliab Alves Pereira

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